Voltei ontem do hospital. Tiraram-me o útero e os ovários. Um corte E-NOR-ME. Não cortaram mais por que acabou o corpinho. Tá bom, eu sou mesmo um pouco dramática, mas achei um exagero o corte. Tive três partos normais para não ter que passar por isso, mas agora me pegaram.
No hospital, depois da cirurgia, desprezei o modelito "bumbum de fora" e coloquei um vestidinho longo, pulseirinha e colar. Fiquei assim vestida o dia todo, até 11 da noite quando então me consolei. Não seria “libertada” naquela noite. ”Duas noites no hospital”, disse o médico. A roupa era pra deixar claro que não pertenço àquele lugar. Camisola nem pensar! Não estou doente! Só conseguia pensar em voltar pra casa.
Um dia depois da cirurgia, chorei muito, andei muito pelo hospital, fui ao berçário, peguei elevador, fumei na esperança de ser expulsa, conversei com as visitas, acompanhantes dos outros coleguinhas, transeuntes, passantes, faxineiras, carreguei soro pro vizinho que precisava se exercitar, distribuí paçocas e balas. E o tempo não passava. Pendurei-me na janela por horas esperando o “resgate” que só seria feito no dia seguinte por duas amigas. Não me deitei na cama nem por um segundo. Permaneceu impecável com seu travesseiro duro de plástico grosso. O tempo não passava. Minha casa...minha casa...minha casa.....
Agora estou em casa. Não senti dores hora nenhuma, só um vazio enorme dentro de uma barriga inchada, estranha, e uma cabeça tentando assimilar o que houve e o que está por vir.
Converso com amigas, parece que todas elas já não tinham “essas partes” há anos!! Sou sempre a última a saber das coisas. Como é que eu não sabia disso? A grande maioria não tem útero há muitos anos!!! Saiu de moda ter útero? E o que vai ser de mim? Como era mesmo aquela história de menopausa? Nos meus 53 anos eu ainda tinha menstruação e planos de um terceiro casamento, desejos, sometimes, de corar quem desenhou o Kama Sutra.
O que vai mudar? Não serei mais desejável ou não irão mais me desejar? E o resultado da biópsia? Será que vou engordar? Morrer? Ficar invisível? Velhíssima? Gagá? Vai ser rápido ou aos poucos?
Por que o médico não me explica isso tudo com calma? É por isso que prefiro médicAs. Elas são mais detalhistas, parece que têm mais tempo. As médicAs falam assim “Querida, dez dias antes você já vai tomando vitamina C com zinco, tal e tal remédio pra prevenir tais coisas, passe só uma base nas unhas. Nos pés você pode por um tonzinho mais forte. Leve uma meinha, chinelinho, camisolinha. Depile aqui e acolá, tome um lanche reforçado por volta das tantas horas etc.” Já o médicO é assim: “Apareça lá às 9hs. A cirurgia é às 13:30h. Jejum de 12 horas”.
De raiva cheguei só uma hora antes. Pra que chegar tanto tempo antes? E ainda por cima de barriga vazia. Nem água podia. No cable TV, no net, no life.
Na próxima vez (que se Deus quiser, será em outra vida) quando começarem com aquelas perguntas “Diabética? Pressão alta? Alergias? “Vou dizer que sim, tenho alergia à bolacha de água e sal e bolacha Maria. Coisa mais chata é ficar 300 horas, tá bom, 20 horas sem comer e alguém chega com a maior cara lavada e te oferece bolacha de água e sal! Tá me estranhando? Me mate de uma vez, sua sonsa! Cadê o cardápio? Que pessoa razoável escolhe bolacha Maria pra comer após ter sido dopada e cortada literalmente ao meio? Doente deve comer o que apetecer!! Minha sábia mãe pedia ovos com bacon quando saia de uma anestesia. No Einstein serviram. O sábio médico autorizou e eu mesma fui até à copa pra pedir e levar pra ela. Esse é o cara! Ah! E também vou levar meu travesseiro de paina.
Mas tudo bem, isso não tem importância, é mais um susto e aquela terrível constatação da nossa fragilidade, aquele choro nervoso de quem escapou por pouco e que sabe que se Deus quisesse poderia ter te levado facim, facim.
Ouvi dizer que quando nascemos, já viemos com um plano lá de cima. E se o médico, quando estava na faculdade, resolveu matar justamente a aula de tirar o útero e foi na padaria comer um pão de queijo? Daí eu teria rodado bonito. Bom, aí já não seria um plano e sim um complô.
Em casa, fiz o que faço sempre nessas ocasiões, chorei uma noite inteira e no dia seguinte amanheço nova, de batom e tudo. Camisolinha, nem pensar! Olhando assim rapidinho você jura que eu estou bem. Por fora a Polyana de sempre e por dentro, cá entre nós, uma Paquita velha... pero no mucho.
Retomei meus medíocres projetos e planos. Medíocres, no sentido de médio, sem megalomania. Medíocres, mas meus. É o que tenho e se derem certo podem me dar alguma satisfação, independente de ter alguém ou não ao meu lado, de ser ou não atraente, jovem ou não. Mas que operar é um susto, isso é!
Tá o maior sol lá fora e esqueci-me de dar quirera pros pardais dessa vida linda. Preciso chamar o jardineiro também.
Inadmissível não mencionar também o apoio dos amigos. Sou abençoada e agradeço a eles pela paciência, carinho, telefonemas... e pelo resgate, é claro.
A águia voltou para o ninho. Missão cumprida com sucesso.
No hospital, depois da cirurgia, desprezei o modelito "bumbum de fora" e coloquei um vestidinho longo, pulseirinha e colar. Fiquei assim vestida o dia todo, até 11 da noite quando então me consolei. Não seria “libertada” naquela noite. ”Duas noites no hospital”, disse o médico. A roupa era pra deixar claro que não pertenço àquele lugar. Camisola nem pensar! Não estou doente! Só conseguia pensar em voltar pra casa.
Um dia depois da cirurgia, chorei muito, andei muito pelo hospital, fui ao berçário, peguei elevador, fumei na esperança de ser expulsa, conversei com as visitas, acompanhantes dos outros coleguinhas, transeuntes, passantes, faxineiras, carreguei soro pro vizinho que precisava se exercitar, distribuí paçocas e balas. E o tempo não passava. Pendurei-me na janela por horas esperando o “resgate” que só seria feito no dia seguinte por duas amigas. Não me deitei na cama nem por um segundo. Permaneceu impecável com seu travesseiro duro de plástico grosso. O tempo não passava. Minha casa...minha casa...minha casa.....
Agora estou em casa. Não senti dores hora nenhuma, só um vazio enorme dentro de uma barriga inchada, estranha, e uma cabeça tentando assimilar o que houve e o que está por vir.
Converso com amigas, parece que todas elas já não tinham “essas partes” há anos!! Sou sempre a última a saber das coisas. Como é que eu não sabia disso? A grande maioria não tem útero há muitos anos!!! Saiu de moda ter útero? E o que vai ser de mim? Como era mesmo aquela história de menopausa? Nos meus 53 anos eu ainda tinha menstruação e planos de um terceiro casamento, desejos, sometimes, de corar quem desenhou o Kama Sutra.
O que vai mudar? Não serei mais desejável ou não irão mais me desejar? E o resultado da biópsia? Será que vou engordar? Morrer? Ficar invisível? Velhíssima? Gagá? Vai ser rápido ou aos poucos?
Por que o médico não me explica isso tudo com calma? É por isso que prefiro médicAs. Elas são mais detalhistas, parece que têm mais tempo. As médicAs falam assim “Querida, dez dias antes você já vai tomando vitamina C com zinco, tal e tal remédio pra prevenir tais coisas, passe só uma base nas unhas. Nos pés você pode por um tonzinho mais forte. Leve uma meinha, chinelinho, camisolinha. Depile aqui e acolá, tome um lanche reforçado por volta das tantas horas etc.” Já o médicO é assim: “Apareça lá às 9hs. A cirurgia é às 13:30h. Jejum de 12 horas”.
De raiva cheguei só uma hora antes. Pra que chegar tanto tempo antes? E ainda por cima de barriga vazia. Nem água podia. No cable TV, no net, no life.
Na próxima vez (que se Deus quiser, será em outra vida) quando começarem com aquelas perguntas “Diabética? Pressão alta? Alergias? “Vou dizer que sim, tenho alergia à bolacha de água e sal e bolacha Maria. Coisa mais chata é ficar 300 horas, tá bom, 20 horas sem comer e alguém chega com a maior cara lavada e te oferece bolacha de água e sal! Tá me estranhando? Me mate de uma vez, sua sonsa! Cadê o cardápio? Que pessoa razoável escolhe bolacha Maria pra comer após ter sido dopada e cortada literalmente ao meio? Doente deve comer o que apetecer!! Minha sábia mãe pedia ovos com bacon quando saia de uma anestesia. No Einstein serviram. O sábio médico autorizou e eu mesma fui até à copa pra pedir e levar pra ela. Esse é o cara! Ah! E também vou levar meu travesseiro de paina.
Mas tudo bem, isso não tem importância, é mais um susto e aquela terrível constatação da nossa fragilidade, aquele choro nervoso de quem escapou por pouco e que sabe que se Deus quisesse poderia ter te levado facim, facim.
Ouvi dizer que quando nascemos, já viemos com um plano lá de cima. E se o médico, quando estava na faculdade, resolveu matar justamente a aula de tirar o útero e foi na padaria comer um pão de queijo? Daí eu teria rodado bonito. Bom, aí já não seria um plano e sim um complô.
Em casa, fiz o que faço sempre nessas ocasiões, chorei uma noite inteira e no dia seguinte amanheço nova, de batom e tudo. Camisolinha, nem pensar! Olhando assim rapidinho você jura que eu estou bem. Por fora a Polyana de sempre e por dentro, cá entre nós, uma Paquita velha... pero no mucho.
Retomei meus medíocres projetos e planos. Medíocres, no sentido de médio, sem megalomania. Medíocres, mas meus. É o que tenho e se derem certo podem me dar alguma satisfação, independente de ter alguém ou não ao meu lado, de ser ou não atraente, jovem ou não. Mas que operar é um susto, isso é!
Tá o maior sol lá fora e esqueci-me de dar quirera pros pardais dessa vida linda. Preciso chamar o jardineiro também.
Inadmissível não mencionar também o apoio dos amigos. Sou abençoada e agradeço a eles pela paciência, carinho, telefonemas... e pelo resgate, é claro.
A águia voltou para o ninho. Missão cumprida com sucesso.
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